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segunda-feira, 18 de setembro de 2017

Rimas


Ontem - quando, soberba, escarnecias
Dessa minha paixão - louca - suprema
E no teu lábio, essa rósea algema,
A minha vida - gélida - prendias...

Eu meditava em loucas utopias, 
Tentava resolver grave problema...
Como engastar tua alma num poema? 
E eu não chorava quando tu te rias...

Hoje, que vivo desse amor ansioso
E és minha - és minha, extraordinária sorte, 
Hoje eu sou triste sendo tão ditoso!

E tremo e choro - pressentindo - forte, 
Vibrar, dentro em meu peito, fervoroso, 
Esse excesso de vida - que é a morte...

- Euclides da Cunha -







Beijões Gordos,

Claudia Rocha GorDivah
Snap: gordivah

sexta-feira, 28 de março de 2014

Poesia: Fernando Pessoa

Quero ser o teu amigo.
Nem demais e nem de menos.
Nem tão longe e nem tão perto.
Na medida mais precisa que eu puder.
Mas amar-te sem medida e ficar na tua vida,
Da maneira mais discreta que eu souber.
Sem tirar-te a liberdade, sem jamais te sufocar.
Sem forçar tua vontade.
Sem falar, quando for hora de calar.
E sem calar, quando for hora de falar.
Nem ausente, nem presente por demais.
Simplesmente, calmamente, ser-te paz.
É bonito ser amigo, mas confesso: é tão difícil aprender!
E por isso eu te suplico paciência.
Vou encher este teu rosto de lembranças,
Dá-me tempo de acertar nossas distâncias.


Fernando Pessoa

quinta-feira, 27 de março de 2014

Eu...

  


        Eu sou a que no mundo anda perdida,
        Eu sou a que na vida nao tem norte,
        Sou a irma do Sonho, e desta sorte
        Sou a cricificada...a dolorida...

        Sombra de nevoa tenue e esvaecida,
        E que o destino amargo, triste e forte,
        Impele brutalmente para a morte!
        Alma de luto sempre incompreendida!...

        Sou aquela que passa e ninguem ve...
        Sou a que chamam de triste sem o ser...
        Sou a que chora sem saber por que...

        Sou talvez a visao que Alguem sonhou,
        Alguem que veio ao mundo pra me ver,
        E que nunca na vida me encontrou!


                                               Florbela Espanca

domingo, 29 de dezembro de 2013

Autopsicografia


O poeta é um fingidor.
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente.

E os que lêem o que escreve,
Na dor lida sentem bem,
Não as duas que ele teve,
Mas só a que eles não têm.

E assim nas calhas de roda
Gira, a entreter a razão,
Esse comboio de corda
Que se chama coração.

Fernando Pessoa

quarta-feira, 11 de dezembro de 2013

Palavras Não Ditas

Palavras não ditas são palavras malditas.
Enfurecidas elas sobem até sua garganta
E se penduram de cabeça para baixo
Se equilibrando, como num show circense

Ah, as palavras não ditas!
Sofridas elas fazem sua cabeça girar
Palavras malditas
Que fazem meu coração sangrar

Essas palavras não ditas,
Impedem a minha despedida
E meu coração, de repousar.

Não quero mais saber de palavras não ditas.
Por isso digo, amor
Aqui, eu não posso mais ficar.

Palavras malditas
Agora ditas
Me fazem chorar.
Mas, não, não posso mais ficar...
Palavras malditas
Agora ditas
Me assombram e afligem
Até que prematuramente, o beijo frio
Em minha face, a ceifadora, venha deixar.


Kcal GorDivah

domingo, 1 de dezembro de 2013

Poema - Cazuza


Eu hoje tive um pesadelo
E levantei atento, a tempo 
Eu acordei com medo
E procurei no escuro 
Alguém com seu carinho
E lembrei de um tempo

Porque o passado me traz uma lembrança 
Do tempo que eu era criança
E o medo era motivo de choro 
Desculpa pra um abraço ou um consolo 

Hoje eu acordei com medo
Mas não chorei nem reclamei abrigo
Do escuro, eu via um infinito
Sem presente, passado ou futuro
Senti um abraço forte, já não era medo
Era uma coisa sua que ficou em mim (que não tem fim)

De repente, a gente vê que perdeu
Ou está perdendo alguma coisa
Morna e ingênua que vai ficando no caminho 
Que é escuro e frio, mas também bonito porque é iluminado
Pela beleza do que aconteceu há minutos atrás

sexta-feira, 8 de novembro de 2013

É Fácil Trocar As Palavras

"É fácil trocar as palavras,
Difícil é interpretar os silêncios!
É fácil caminhar lado a lado,
Difícil é saber como se encontrar!
É fácil beijar o rosto,
Difícil é chegar ao coração!
É fácil apertar as mãos,
Difícil é reter o calor!
É fácil sentir o amor,
Difícil é conter sua torrente!

Como é por dentro outra pessoa?
Quem é que o saberá sonhar?
A alma de outrem é outro universo
Com que não há comunicação possível,
Com que não há verdadeiro entendimento.

Nada sabemos da alma
Senão da nossa;
As dos outros são olhares,
São gestos, são palavras,
Com a suposição
De qualquer semelhança no fundo." 


Fernando Pessoa


quinta-feira, 31 de outubro de 2013

O Sofrimento É Opcional

"A cada dia que vivo, 

mais me convenço de que 

desperdício da vida está 

no amor que não damos,

nas forças que não usamos,

na prudência egoísta 

que nada arrisca e que, 

esquivando-nos do sofrimento, 

perdemos também 

a felicidade.

A dor é inevitável. 

O sofrimento é opcional.”


Carlos Drummond de Andrade

quinta-feira, 24 de outubro de 2013

Há Momentos

Há momentos na vida em que sentimos tanto
a falta de alguém que o que mais queremos
é tirar esta pessoa de nossos sonhos
e abraçá-la.
Sonhe com aquilo que você quiser.
Seja o que você quer ser,
porque você possui apenas uma vida
e nela só se tem uma chance
de fazer aquilo que se quer.
Tenha felicidade bastante para fazê-la doce.
Dificuldades para fazê-la forte.
Tristeza para fazê-la humana.
E esperança suficiente para fazê-la feliz.
As pessoas mais felizes
não têm as melhores coisas.
Elas sabem fazer o melhor
das oportunidades que aparecem
em seus caminhos.
A felicidade aparece para aqueles que choram.
Para aqueles que se machucam.
Para aqueles que buscam e tentam sempre.
E para aqueles que reconhecem
a importância das pessoas que passam por suas vidas.
O futuro mais brilhante
é baseado num passado intensamente vivido.
Você só terá sucesso na vida
quando perdoar os erros
e as decepções do passado.
A vida é curta, mas as emoções que podemos deixar
duram uma eternidade.
A vida não é de se brincar
porque um belo dia se morre.

— Clarice Lispector

sábado, 15 de junho de 2013

Abandonar As Velhas Roupas Usadas

 
 
Há um tempo em que é preciso abandonar as roupas usadas ...
Que já têm a forma do nosso corpo ...
E esquecer os nossos caminhos que nos levam sempre aos
mesmos lugares ...

É o tempo da travessia ...
E se não ousarmos fazê-la ...
Teremos ficado ... para sempre ...
À margem de nós mesmos...
 
 
Fernando Pessoa

segunda-feira, 10 de junho de 2013

Saudade



Por que sinto falta de você? Por que esta saudade?
Eu não te vejo mas imagino suas expressões, sua voz teu cheiro.
Sua amizade me faz sonhar com um carinho,
Um caminhar, a luz da lua, a beira mar.
Saudade este sentimento de vazio que me tira o sono
me fazendo sentir num triste abandono, é amizade eu sei, será amor talvez...
Só não quero perder sua amizade, esta amizade...
Que me fortalece me enobrece por ter você.
Machado de Assis

domingo, 9 de junho de 2013

Felicidade


 
 
Não se acostume com o que não o faz feliz, revolte-se quando julgar necessário. 
Alague seu coração de esperanças, mas não deixe que ele se afogue nelas. 
Se achar que precisa voltar, volte! 
Se perceber que precisa seguir, siga! 
Se estiver tudo errado, comece novamente. 
Se estiver tudo certo, continue.
Se sentir saudades, mate-a. 
Se perder um amor, não se perca! 
Se o achar, segure-o!

Fernando Pessoa


sábado, 8 de junho de 2013

Há Momentos



Há momentos na vida em que sentimos tanto
a falta de alguém que o que mais queremos
é tirar esta pessoa de nossos sonhos
e abraçá-la.

Sonhe com aquilo que você quiser.
Seja o que você quer ser,
porque você possui apenas uma vida
e nela só se tem uma chance
de fazer aquilo que se quer.

Tenha felicidade bastante para fazê-la doce.
Dificuldades para fazê-la forte.
Tristeza para fazê-la humana.
E esperança suficiente para fazê-la feliz.

As pessoas mais felizes
não têm as melhores coisas.
Elas sabem fazer o melhor
das oportunidades que aparecem
em seus caminhos.

A felicidade aparece para aqueles que choram.
Para aqueles que se machucam.
Para aqueles que buscam e tentam sempre.
E para aqueles que reconhecem
a importância das pessoas que passam por suas vidas.

O futuro mais brilhante
é baseado num passado intensamente vivido.
Você só terá sucesso na vida
quando perdoar os erros
e as decepções do passado.

A vida é curta, mas as emoções que podemos deixar
duram uma eternidade.
A vida não é de se brincar
porque um belo dia se morre.
Clarice Lispector

sexta-feira, 7 de junho de 2013

Alberto Caeiro, em "O Guardador de Rebanhos", 8-3-191



    O meu olhar é nítido como um girassol.
    Tenho o costume de andar pelas estradas
    Olhando para a direita e para a esquerda,
    E de vez em quando olhando para trás...
    E o que vejo a cada momento
    É aquilo que nunca antes eu tinha visto,
    E eu sei dar por isso muito bem...
    Sei ter o pasmo essencial
    Que tem uma criança se, ao nascer,
    Reparasse que nascera deveras...
    Sinto-me nascido a cada momento
    Para a eterna novidade do Mundo...Creio no mundo como num malmequer,
    Porque o vejo. Mas não penso nele
    Porque pensar é não compreender...
    O Mundo não se fez para pensarmos nele
    (Pensar é estar doente dos olhos)
    Mas para olharmos para ele e estarmos de acordo...
    Eu não tenho filosofia; tenho sentidos...
    Se falo na Natureza não é porque saiba o que ela é,
    Mas porque a amo, e amo-a por isso
    Porque quem ama nunca sabe o que ama
    Nem sabe por que ama, nem o que é amar...
    Amar é a eterna inocência,
    E a única inocência não pensar...


quinta-feira, 6 de junho de 2013

Versos Íntimos



Vês! Ninguém assistiu ao formidável
Enterro de tua última quimera.
Somente a Ingratidão – esta pantera –
Foi tua companheira inseparável!

Acostuma-te à lama que te espera!
O Homem, que, nesta terra miserável,
Mora entre feras, sente inevitável
Necessidade de também ser fera.

Toma um fósforo. Acende teu cigarro!
O beijo, amigo, é a véspera do escarro,
A mão que afaga é a mesma que apedreja.

Se a alguém causa inda pena a tua chaga,
Apedreja essa mão vil que te afaga,
Escarra nessa boca que te beija!
Augusto dos Anjos

quarta-feira, 5 de junho de 2013

O Corvo

  Em certo dia, à hora, à hora
      Da meia-noite que apavora,
Eu, caindo de sono e exausto de fadiga,
      Ao pé de muita lauda antiga,
   De uma velha doutrina, agora morta,
   Ia pensando, quando ouvi à porta
   Do meu quarto um soar devagarinho,
      E disse estas palavras tais:
"É alguém que me bate à porta de mansinho;
      Há de ser isso e nada mais".

      Ah! bem me lembro! bem me lembro!
      Era no glacial dezembro;
Cada brasa do lar sobre o chão refletia
      A sua última agonia.
   Eu, ansioso pelo sol, buscava
   Sacar daqueles livros que estudava
   Repouso (em vão!) à dor esmagadora
      Destas saudades imortais
Pela que ora nos céus anjos chamam Lenora.
      E que ninguém chamará mais.

      E o rumor triste, vago, brando
Das cortinas ia acordando
      Dentro em meu coração um rumor não sabido,
      Nunca por ele padecido.
   Enfim, por aplacá-lo aqui no peito,
   Levantei-me de pronto, e: "Com efeito,
   (Disse) é visita amiga e retardada
      Que bate a estas horas tais.
É visita que pede à minha porta entrada:
      Há de ser isso e nada mais".

      Minh'alma então sentiu-se forte;
      Não mais vacilo e desta sorte
Falo: "Imploro de vós,— ou senhor ou senhora,
      Me desculpeis tanta demora.
   Mas como eu, precisando de descanso,
   Já cochilava, e tão de manso e manso
   Batestes, não fui logo, prestemente,
      Certificar-me que aí estais".
Disse; a porta escancaro, acho a noite somente,
      Somente a noite, e nada mais.

      Com longo olhar escruto a sombra,
      Que me amedronta, que me assombra,
E sonho o que nenhum mortal há já sonhado,
      Mas o silêncio amplo e calado,
   Calado fica; a quietação quieta;
   Só tu, palavra única e dileta,
   Lenora, tu, como um suspiro escasso,
      Da minha triste boca sais;
E o eco, que te ouviu, murmurou-te no espaço;
      Foi isso apenas, nada mais.

      Entro coa alma incendiada.
      Logo depois outra pancada
Soa um pouco mais forte; eu, voltando-me a ela:
      "Seguramente, há na janela
   Alguma cousa que sussurra. Abramos,
Eia, fora o temor, eia, vejamos
   A explicação do caso misterioso
      Dessas duas pancadas tais.
      Devolvamos a paz ao coração medroso,
      Obra do vento e nada mais".

      Abro a janela, e de repente,
      Vejo tumultuosamente
Um nobre corvo entrar, digno de antigos dias.
      Não despendeu em cortesias
      Um minuto, um instante. Tinha o aspecto
      De um lord ou de uma lady. E pronto e reto,
      Movendo no ar as suas negras alas,
      Acima voa dos portais,
Trepa, no alto da porta, em um busto de Palas;
      Trepado fica, e nada mais.

      Diante da ave feia e escura,
      Naquela rígida postura,
Com o gesto severo, — o triste pensamento
      Sorriu-me ali por um momento,
E eu disse: "O tu que das noturnas plagas
   Vens, embora a cabeça nua tragas,
   Sem topete, não és ave medrosa,
      Dize os teus nomes senhoriais;
Como te chamas tu na grande noite umbrosa?"
     E o corvo disse: "Nunca mais".

      Vendo que o pássaro entendia
      A pergunta que lhe eu fazia,
Fico atônito, embora a resposta que dera
      Dificilmente lha entendera.
   Na verdade, jamais homem há visto
   Cousa na terra semelhante a isto:
   Uma ave negra, friamente posta
      Num busto, acima dos portais,
Ouvir uma pergunta e dizer em resposta
      Que este é seu nome: "Nunca mais".

      No entanto, o corvo solitário
      Não teve outro vocabulário,
Como se essa palavra escassa que ali disse
      Toda a sua alma resumisse.
   Nenhuma outra proferiu, nenhuma,
   Não chegou a mexer uma só pluma,
   Até que eu murmurei: "Perdi outrora
      Tantos amigos tão leais!
Perderei também este em regressando a aurora".
      E o corvo disse: "Nunca mais!".

      Estremeço. A resposta ouvida
      É tão exata! é tão cabida!
"Certamente, digo eu, essa é toda a ciência
      Que ele trouxe da convivência
   De algum mestre infeliz e acabrunhado
   Que o implacável destino há castigado
   Tão tenaz, tão sem pausa, nem fadiga,
      Que dos seus cantos usuais
Só lhe ficou, na amarga e última cantiga,
      Esse estribilho: "Nunca mais".

      Segunda vez, nesse momento,
      Sorriu-me o triste pensamento;
Vou sentar-me defronte ao corvo magro e rudo;
      E mergulhando no veludo
   Da poltrona que eu mesmo ali trouxera
   Achar procuro a lúgubre quimera,
   A alma, o sentido, o pávido segredo
      Daquelas sílabas fatais,
Entender o que quis dizer a ave do medo
      Grasnando a frase: "Nunca mais".

      Assim posto, devaneando,
      Meditando, conjeturando,
Não lhe falava mais; mas, se lhe não falava,
      Sentia o olhar que me abrasava.
   Conjeturando fui, tranqüilo a gosto,
   Com a cabeça no macio encosto
   Onde os raios da lâmpada caíam,
      Onde as tranças angelicais
De outra cabeça outrora ali se desparziam,
      E agora não se esparzem mais.

      Supus então que o ar, mais denso,
      Todo se enchia de um incenso,
Obra de serafins que, pelo chão roçando
      Do quarto, estavam meneando
   Um ligeiro turíbulo invisível;
   E eu exclamei então: "Um Deus sensível
   Manda repouso à dor que te devora
      Destas saudades imortais.
Eia, esquece, eia, olvida essa extinta Lenora".
      E o corvo disse: "Nunca mais".

"Profeta, ou o que quer que sejas!
      Ave ou demônio que negrejas!
Profeta sempre, escuta: Ou venhas tu do inferno
      Onde reside o mal eterno,
   Ou simplesmente náufrago escapado
   Venhas do temporal que te há lançado
   Nesta casa onde o Horror, o Horror profundo
      Tem os seus lares triunfais,
Dize-me: existe acaso um bálsamo no mundo?"
      E o corvo disse: "Nunca mais".

      "Profeta, ou o que quer que sejas!
      Ave ou demônio que negrejas!
Profeta sempre, escuta, atende, escuta, atende!
      Por esse céu que além se estende,
   Pelo Deus que ambos adoramos, fala,
   Dize a esta alma se é dado inda escutá-la
   No éden celeste a virgem que ela chora
      Nestes retiros sepulcrais,
Essa que ora nos céus anjos chamam Lenora!"
      E o corvo disse: "Nunca mais".

      "Ave ou demônio que negrejas!
       Profeta, ou o que quer que sejas!
Cessa, ai, cessa! clamei, levantando-me, cessa!
      Regressa ao temporal, regressa
   À tua noite, deixa-me comigo.
   Vai-te, não fique no meu casto abrigo
   Pluma que lembre essa mentira tua.
      Tira-me ao peito essas fatais
Garras que abrindo vão a minha dor já crua."
      E o corvo disse: "Nunca mais".

      E o corvo aí fica; ei-lo trepado
      No branco mármore lavrado
Da antiga Palas; ei-lo imutável, ferrenho.
      Parece, ao ver-lhe o duro cenho,
   Um demônio sonhando. A luz caída
   Do lampião sobre a ave aborrecida
   No chão espraia a triste sombra; e, fora
      Daquelas linhas funerais
Que flutuam no chão, a minha alma que chora
      Não sai mais, nunca, nunca mais


Edgar Allan Poe

terça-feira, 4 de junho de 2013

Poesia - Machado de Assis

A primeira glória é a reparação dos erros.

As ocasiões fazem as revoluções.

O amor é o rei dos moços e o tirano dos velhos.

O amor é o egoísmo duplicado.

Não se perde nada em parecer mau - ganha-se tanto como em sê-lo.

Também a dor tem suas hipocrisias.

O medo é um preconceito dos nervos. E um preconceito, desfaz-se - basta a simples reflexão.

Dormir é um modo interino de morrer.

O tempo é um rato roedor das coisas, que as diminui ou altera no sentido de lhes dar outro aspecto.

Matamos o tempo - o tempo nos enterra.

Amor repelido é amor multiplicado.

De todas as coisas humanas, a única que tem o fim em si mesma é a arte.

O destino, como os dramaturgos, não anuncia as peripécias nem o desfecho.

Não se ama duas vezes a mesma mulher.

A vaidade é um princípio de corrupção.

Não há alegria pública que valha uma boa alegria particular.

Suporta-se com muita paciência a dor no fígado alheio.

A fortuna troca, ás vezes, os cálculos da natureza.


Machado de Assis

segunda-feira, 3 de junho de 2013

Motivo



Eu canto porque o instante existe
e a minha vida está completa.
Não sou alegre nem sou triste:
sou poeta.


Irmão das coisas fugidias,
não sinto gozo nem tormento.
Atravesso noites e dias
no vento.


Se desmorono ou se edifico,
se permaneço ou me desfaço,
— não sei, não sei. Não sei se fico
ou passo.


Sei que canto. E a canção é tudo.
Tem sangue eterno a asa ritmada.
E um dia sei que estarei mudo:

— mais nada.

Cecília Meireles